Ao ignorar decisão do Legislativo, governo cria precedente perigoso e prejudica setores empregadores – Ministro da Fazenda Fernando Haddad - Foto: Washington Costa/MF |
Governo desrespeita decisão do Congresso e edita MP para anular desoneração da folha de pagamento
A pretexto de buscar o equilíbrio das contas públicas, o que é salutar na gestão, o governo federal atropela a construção de uma ampla negociação em âmbito nacional, ao editar a Medida Provisória (MP) 1.202 para anular a decisão do Congresso Nacional que prorrogou a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia intensivos em mão de obra, os quais empregam mais de 9 milhões de pessoas.
A edição da MP que reúne um pacote do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para tentar zerar o déficit das contas públicas federais nos próximos anos vai na contramão do que se entende como "jogo jogado" na esfera política, em que o Executivo vetou a renovação da desoneração da folha por mais quatro anos – até dezembro de 2027 – e o Congresso derrubou o veto do presidente Lula. Com o agravante de que a MP foi publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte à publicação da lei dispondo sobre a prorrogação da desoneração, num claro desrespeito à soberania do Congresso Nacional, que representa o povo brasileiro e, em seu nome, barrou o veto.
Analogamente comparando, é como se numa partida de futebol, depois de o juiz marcar um pênalti e o VAR decidir em contrário, um terceiro ente (no caso o governo federal), se arvorando de dono de poderes ainda maiores, entrar em campo e "melar" o jogo no tapetão.
Pela proposta promulgada pelo Congresso, empresas desses setores potenciais empregadores podem substituir a contribuição previdenciária – de 20% sobre os salários dos funcionários – por uma alíquota sobre a receita bruta do empreendimento, que varia de 1% a 4,5%, de acordo com o setor e serviço prestado.
No pacote de reação do governo, estão o retorno gradual da cobrança de impostos, uma mudança de impacto no benefício do PERSE (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos), redução de aproveitamento de crédito oriundo de decisões judiciais e a Lei da Subvenção (MP 1185), que vai afetar quem tem benefícios fiscais pelo Produzir ou Fomentar, já que o saldo de 70% vai ser tributado pelo Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.
Baixada no apagar das luzes do ano de 2023, com o Congresso em recesso, a MP 1.202 provoca desequilíbrio entre os Poderes e fere várias das condições previstas em 12 parágrafos do artigo 62 da Constituição Federal que regulam a edição de medidas provisórias, o que a torna inconstitucional.
A exemplo do que já havia ocorrido no caso da MP 1185, novamente o governo federal reage diante de decisões desfavoráveis no âmbito do Legislativo e do Judiciário, criando um modus operandi grave, de mal-estar entre os Poderes e penalizando o contribuinte, o setor produtivo, com a insegurança jurídica e o aumento da carga tributária inviabilizando investimentos e geração de emprego e renda de que o País tanto precisa.
A Medida Provisória 1.202, publicada no Diário Oficial da União desta sexta-feira (29), tem como principais pontos:
- Retorno gradual da cobrança da contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento de empresas de 17 setores da economia que atualmente tem este benefício (art. 1o e anexos I e II). As alíquotas serão reajustadas anualmente de 2024 a 2027;
- Limita a aplicação da alíquota reduzida ao valor de até 1 salário mínimo por trabalhador (parágrafo único do art. 1o);
- Exige que as empresas beneficiadas mantenham o mesmo número de empregados, sob pena de perda do benefício (art. 3o);
- Limita o valor mensal que pode ser usado para compensar créditos de empresas decorrentes de decisões judiciais (art. 4o, que altera a Lei 9.430/1996);
- Revoga a lei que havia prorrogado a desoneração da folha de 17 setores até 2027 (art. 6o, II, d);
- Entra em vigor em abril de 2024, com efeitos retroativos a janeiro de 2024 para alguns tributos (art. 7o).
O que diz o Governo
O governo justifica que a medida ajudará a alcançar o déficit zero nas contas públicas. Parlamentares criticaram a MP, afirmando que fere prerrogativas do Congresso e pode causar demissões. Há pedidos para que o presidente do Congresso devolva a MP sem análise. A MP entra em vigor na publicação, mas algumas mudanças só depois de 90 dias.
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